terça-feira, 22 de dezembro de 2009

O Taj Mahal ficou pequeno

Pela segunda vez em Agra, a cidade do famoso Taj Mahal!
O trem chegou bem cedinho, as seis da manha. Sem planos e sem saber onde ficar eu e a Ca saimos da estacao e pegamos o primeiro rickshaw disponivel. Tinhamos certeza de que ele nos ajudaria a encontrar algum albergue, afinal, Agra e a cidade mais famosa e mais turistica da India.
O motorista, muito simpatico, nos levou ate a rua onde ficam a maioria dos albergues e depois de ver alguns quartos - que mais pareciam caixas de sapato mofadas - encontramos um lugar bom e com preco razoavel, afinal iriamos embora na mesma noite, agente so precisava de um lugar para descansar, tomar um banho e deixar as mochilas.
Depois de alguns "longos" minutos de negociacao combinamos com o motorista um preco fixo para fazer um city tour na parte da tarde. Aproveitamos as horas livres para descansar, tomar banho e ir a pe ate o Taj Mahal. O albergue era bem pertinho. Acompanhei a Ca ate a entrada mas nao quis entrar. Ja conhecia a parte de dentro e tambem quis economizar as 750,00 rupias da entrada.

Voltei para o albergue e fiquei observando o Taj do roof top, o que e uma visao bem diferente. La de cima da para observar a grandeza, beleza e brancura desse monumento como "pano de fundo" de uma cidade suja, baguncada e caotica, uma cidade que vive em funcao do Taj. Comercio, hoteis, restaurantes...todo um enorme movimento devido a um unico monumento.
Quando a Ca voltou ficamos a espera do motorista, mas ao inves dele veio outro - o primo dele - Aamir. E mais uma vez o destino provando que nada e por acaso, ou talvez que tudo seja por acaso, ainda nao consegui decifrar esse misterio da vida :)
Aamir era bem novinho, devia ter uns 20 anos no maximo. Estava extremamente contente, era sua primeira viagem com turistas. Ele nos levou ate o Agra Fort, depois fomos para uma rota alternativa, uma rua de onde e posivel ver o Taj por detras do lago. Novamente me espantei e me encantei com a grandeza daquela construcao! Logo depois fomos ver o "baby Taj", foi construido antes do Taj, e exatamente identico mas em proporcoes menores. Parece que foi uma "maquete" antes da construcao do principal.
No caminho Aamir perguntou se ele poderia nos levar para conhecer sua casa e sua familia, ele estava muito feliz com as "primeiras turistas" e queria mostrar para a familia. E claro que aceitamos! Na hora ele deu um sorriso, pegou o celular e pelo o que eu pude entender, avisou alguem que estariamos chegando. Aamir nao tirava o sorriso do rosto, parecia estar em extase!

No caminho pude perceber que estavamos saindo do centro da cidade e indo para lugares onde nao se encontra turista algum. As pesoas ja te olham diferente, mais assustadas e curiosas. Alguns minutos depois ele para o rickshaw e pede para agente descer. Era uma rua bem movimentada, co algumas lojas, barraquinhas de comida, muito suja... em meio a buzinas, scooters, charretes, vacas, cabritos e muito olhares curiosos nos descemos e seguimos Aamir que logo entrou em uma ruela muito estreita, um lugar de casas muito simples, pequenas e amontoadas, como se fosse uma favela.

O que aconteceu dali em diante foram momentos marcantes e inesqueciveis em minha vida. A cada casa que agente ia passando as criancas saiam correndo, as pessoas vinham ate a porta, os jovens iam nos seguindo. Quando olhei para tras uma multidao havia se juntado a nos e nos seguiam gritando, sorrindo, fazendo a maior festa. Continuamos andando por ruas mais e mais estreitas, como se fose um labirinto meio escuro e sujo quando enfim chegamos na casa de Aamir. Toda a familia estava a nossa espera! A mae dele estava toda maquiada e vestindo um saree muito lindo, assim como a irma mais nova que tambem estava toda produzida. Pude perceber que tal arrumacao estetica foi especialmente para nos receber.
Entramos na casa, que era na verdade apenas uma "sala" e uma cozinha.
Avos, primos, sobrinhos, irmaos, todos estavam la. Nos sentamos e ele nos apresentou um por um. Os olhos espantados dessas pessoas ficavam nos analisado e mal conseguiam piscar, e era um olhar cheio de admiracao, cheio de respeito e carinho. E como sao delicadas esas pessoas! A mae dele preparou o famoso "chai" e fez questao de nos servir em duas xicaras de porcelana! (isso me lembrou a familia que conheci em Sikkim, que tambem fez questao de me servir o cha na melhor xicara da prateleira). Alem disso, alguem da familia foi ate alguma vendinha so para comprar biscoitos para agente.

E la estava eu, sentada, tomando um chai e sendo observada por umas 15 pessoas que ficavam de pe, ao meu redor, me admirando. E nesse momento eu pude sentir novamente o verdadeiro calor humano, o amor, a pureza e humildade desas pessoas incriveis.
Eu me senti pequena! Rodeada por essa gente eu me senti um nada... Nem a grandeza e imponencia do Taj Mahal foi capaz de fazer eu me sentir tao pequena. Eu estava ali, diante do maior monumento da vida humana- o amor- sentindo uma energia monumental e me perguntando o por que?
Por que essas pessoas me tratam tao bem? Por que elas sao tao boas com completos desconhecidos? Por que tanta admiracao?

Saindo de la Aamir ainda nos levou para a casa da outra tia, depois para a casa do outro irmao, e asim fizemos o tour pela familia inteira! Ate autografo eu tive que dar no meio do caminho (por pura insistencia pois eu recusei ate onde pude).

Milhoes de pessoas do mundo inteiro vem a Agra admirar o Taj Mahal, a grandeza e beleza desse monumento que e na verdade uma prova de amor de um homem para sua amada. E eu tive a sorte de provar do mais puro sentimento, e esse sim e gigante!
Por mais que o homem tente, materializar um sentimento e imposivel. Poderiam construir um palacio 10 vezes maior que o Taj que nada disso teria a dimensao do que foi estar rodeada de puro sentimento.
O Taj ficou pequeno perto desse carinho todo. Eu fiquei pequena perto dessas pessoas. Miha existencia e minhas atitudes me pareceram nulas por alguns minutos.

Precisamos de sentimentos e nao de provas de um sentimento, mas sera que as pessoas so conseguem ver a beleza do amor de uma forma palpavel e materializada?
Tenho a sensacao de que estamos perdendo a sensibilidade e enxergando apenas aquilo que nossos olhos podem ver, deixando muita vida se perder pelo caminho.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Por que aqui ate o Bon Jovi me emociona?

Mais de um mes sem escrever por aqui.

Eh! Confesso que abandonei o blog, mas a questao 'e que nao gosto de escrever pelo simples sentimento de estar fazendo algo por obrigacao. Me incomoda pensar que as pessoas talvez entrem no blog procurando ler novas postagens, mas eu escrevo apenas quando me sinto inspirada, como e o caso de agora por exemplo. Estou sentada no trem, rumo a Mumbai para encontrar minha amiga Camila, que esta chegando para juntas comecarmos um mochilao de 2 meses pela Asia.

E por que a inspiracao me veio? Bom, em primeiro lugar - e o principal motivo - e porque estou de volta a India! Acabei de chegar de 1 mes de ferias no Brasil, ferias que me serviram como um " teste espiritual". Sinceramente, mes passado, logo antes de ir ao Brasil eu estava muito saudosista, quase que no meu limite aqui na India. Sentia falta de tudo:de uma boa comida caseira (arroz, feijao,bife), do conforto de casa, de um banho quente, da familia, dos amigos, da vida social...estava muito ansiosa para chegar em Sao Paulo. E nao vou negar,esse mes por la foi otimo - em muitos aspectos. Rever meus pais e irmaos foi uma felicidade incrivel. Poder sair com as amigas, sentar em algum lugar qualquer e poder conversar com pessoas que te entendem, te apoiam, te aconselham, nao tem preco! Tambem aproveitei e me esbanjei de boa comida, idas ao cinema, baladas. Enfim,me saturei de todos esses prazeres.

Em contrapartida muitas vezes me sentia como um peixe fora d'agua. Certo estranhamento pairava no ar dos meus dias em SP. Me senti diferente e em certas situacoes ate um pouco deslocada. Acho que voltei em outro ritmo, em outra fase.

Minha sensacao era a de observar tudo ao meu redor em camera lenta. Pode parecer estranho falar isso visto que a rotina de uma cidade como SP exige da maioria das pessoas um ritmo frenetico e estressante, onde as 24 horas de um dia nao parecem ser o suficiente para tantos afazeres, compromissos e obrigacoes. O fato e que mesmo estando no meio dessa convulsao de movimentos e tarefas, era dificil enxergar alguma mudanca relevante nas pessoas. Todos continuam iguais, repetitivos e estagnados provando que todo esse movimento e velocidade dos fatos e acontecimentos sao inuteis! Por isso minha sensacao de camera lenta. Nao pela velocidade da rotina das pessoas, mas em relacao ao crescimento valido de cada um. Corremos...mas em busca do que? Sera que a maioria dos nossos dias sao em funcao de buscas superfluas ou de descobertas realmente validas?

Fiquei triste ao perceber que nesse 1 mes nao consegui escrever. Poderia ate dizer que foi por falta de tempo, mas na realidade, o que de fato aconteceu foi que eu nao me dei o tempo para escrever. Na quis por nao me sentir inspirada a relatar qualquer coisa.

Mas ca estou. De volta a Baroda! dificil descrever minha felicidade. Mais dificil ainda tentar exprimir a transformacao que esse lugar causa dentro de mim. Basta chegar aqui, sentir a energia do lugar que meu coracao se enche de alegria e de uma certa forma, se acalma trazendo de volta minha inspiracao; como agora,bem aqui, no trem, onde divido um banco com mais 6 pessoas. E sao elas o fruto da minha inspiracao. A bondade, humildade e alegria dessas pessoas me comove e me traz de volta os verdadeiros valores humanos.

Eu estava sentada, observando pela janela do trem os vilarejos, as pessoas pobres fazendo suas necessidas ao longo do trilho do trem, sentindo o vento da manha - que junto traz aquele cheiro fetido - e pensando na vida de cada um daqueles seres humanos que sobrevivem em condicoes muito precarias. Foi quando uma mocinha que estava sentada na minha frente ouvindo um MP3 me passou os fones de ouvido dizendo:
- Please madame, listen this song! English song! You like right? American song!

Ouvi a musica, e digo que o Bon Jovi nunca me emocionou tanto.
Continuei observando as diversas vidas que passavem pela janela, ouvindo a musica e olhando nos olhos da menina a felicidade que ela transmitia por compartilhar comigo uma musica, que por ser em ingles, ela assumiu como algo que eu gostaria. E a felicidade dela era devido a minha felicidade! Ela estava contente por compartilhar comigo algo que faz parte da minha cultura, das minhas "lembrancas de casa".
Enquanto eu ouvia a musica, ela nao tirava os olhos de mim, checando se eu estava aproveitando e gostando do som, certificando-se de que conseguira me agradar. Nao demonstrei o contrario. Fiquei balancando a cabeca e por mais que eu nao goste tanto assim de Bon Jovi, fiz questao de cantar a parte da musica que eu sabia e ela sorria satisfeita!
Sei que tenho muita sorte por estar vivenciando e sentindo tudo isso. Sentindo tanta energia positiva de pessoas como essa menina, pessoas que sao de alguma forma muito mais elevadas que nos e que tem muito a nos ensinar. Me intriga e me falta a compreensao para entender como essas pessoas, vivendo em condicoes que provocam a indignacao a quem as observa de fora, conseguem ser tao -ou mais- dignas quanto esses proprios espectadores.

E em homenagem ao Bon Jovi, um trecho da musica que foi responsavel por essa atitude simples e pura.

It's my life
It's now or never
I ain't gonna live forever
I just want to live while I'm alive
It's my life
My heart is like an open highway
Like Frankie saidI did it my way
I just wanna live while I'm alive
It's my life!

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

I Love Mumbai!

Ja faz algum tempo que pretendo escrever sobre Mumbai, mas nao havia sentido ainda que era a hora, me faltava inspiraçao para escrever e tentar descrever essa cidade tao singular. Esse final de semana foi minha quinta vez na cidade e agora sinto que posso me arriscar a escrever. Digo arriscar pois mesmo sendo detalhista sei que e impossivel transmitir o que Mumbai representa, o que Mumbai provoca dentro de mim.

O que aconteceu de tao diferente dessa vez?
Foram 2 fatos sobre os quais vou dissertar, 2 fatos que representam o que eu acredito ser o grande diferencial dessa megalopole indiana. Dois fatos que retratam os seus habitantes. As pessoas! sao as pessoas dessa cidade que cosegue transformar o caotico em harmonioso, a pobreza em alegria, o susto em risada e o transtorno em reflexao.

Mumbai fica a 6 horas de trem de Vadodara, e para a maioria dos trainees (inclusive eu), ir a Mumbai durante o final de semana significa fugir do marasmo de Vadodara. E um final de semana para comer bem, ir a algum bar com os amigos e aproveitar a vida noturna.
Dessa vez eu fui sozinha. Um amigo meu que mora por la estava organizando uma noite de musica ao vivo na casa dele e como nao havia ninguem em Vadodara pois os trainees tinham ido viajar, resolvi pegar o trem no sabado de manha e chegar em Mumbai as quatro da tarde.
Ao descer na estaçao, fui empurrada no meio daquela muvuca ate a saida, onde peguei um taxi.Os taxis em Mumbai sao aqueles tipicos carros ingleses atigos, pintado de preto e amarelo. Logo na saida da estaçao havia uma fila enorme deles estacionados. Assim que me viram aproximar a disputa começou. Todos abrindo a porta, me chamando para entrar no taxi. Sendo turista eles sabem que e dinheiro garantido. Nao escolhi nem um , nem outro...continuei caminhando ate que vi um taxi mais a frente onde o motorista estava sentado no banco traseiro, mexendo concentradamente no celular. E esse taxi que vou pegar! Sabia decisao...como sempre, o vento estava a meu favor.

Tentei explicar o endereço para ele, mas como nao falava quase nada em ingles, foi complicado. Resolvi ligar para o meu amigo que explicou o caminho e fechou o preço em 200 rupias, ou seja, 4 dolares. O motorista era bem magrinho, miudo, com os olhos grandes e um sorriso (que apesar de destruido) um sorriso maior ainda. Estava todo feliz por me levar, toda hora olhava pelo retrovisor e abria um sorrisao. Por todo o taxi que passava ele buzinava, querendo mostrar a “turista” que ele levava. A alegria dele tinha um bom motivo. Muitos desses taxis nao sao propriedade do motorista em si. O que acontece e que eles “alugam” o carro. Na maioria das vezes eles pagam 300 rupias por semana ao dono do taxi, o lucro e dele, mas despesas com gasolina e manutençao tambem. Portanto,uma corrida com um turista, por 200 rupias e um grande motivo para comemorar.
Enfim....Mumbai e como uma Sao Paulo...cidade grande, trafego intenso. O caminho todo estava naquele tipico “anda-para”. Toda vez que parava, o motorista desligava o carro e so dava a partida novamente qdo o transito começava a andar. Diversas vezes ele tentava conversar comigo. Falava em hindi, como se eu pudesse entender, e as vezes algumas palavras em ingles.
-“ slow traffic Madame, slow traffic”.... a corrida levou quase 2 horas.

La pela metade do caminho ele parou o carro para comprar cigarros: One minute Madame, one minute....cigaret, one minute ok?
Aproveitei que ele parou e mostrando para ele minhas pilhas usadas, pedi para ele comprar pilhas novas para minha camera. Com um sorriso no rosto, depois de alguns minutos ele voltou com o cigarro e as pilhas.Troquei as pilhas e quando ele reparou que eu estava guardando a embalagem de volta na minha mochila para jogar fora depois, em um lixo, ele sorriu e falou em uma mistura de mimica com hindi e ingles: “ window Madame....put in the window...
Eu logo repliquei: Nehi, nehi....nao nao...
Ele insistiu...Dont worry Madame, window is ok Madame...here is India, India the best! India the best Madame! Not a problem in India, not a problem!
Obvio que eu nao joguei pela janela apesar de saber que e algo totalmente normal pra eles.

O trafego continuava parado, andavamos 5 metros a cada 5 minutos e em uma das vezes em que ele foi dar a partida, o carro nao pegou. Ele tentou 2, 3, 4, 5 vezes...e nada...nem um barulhinho...ele entao desceu do carro e com as maos na porta empurrou por alguns segundo e voltou correndo para dar a partida...nada.....tentou fazer isso mais algumas vezes e nada.....ele me olhou, estava suando, seu olhar estava inquieto mas me abriu um sorriso e disse: Dont worry Madame, my cab, good cab, not a problem Madame, 1 minute, 1 minute...

O transito estava parado, eu nao tinha muitas opçoes, por isso continuei sentada esperando para ver se algo acontecia...foi quando ele abriu o porta-luva e de la tirou uma chave de fenda. Abriu o capo, desceu do carro e foi tentar concertar...o capo estava tampando a minha visao, eu so ouvia os barulhos e algumas vezes ate via as faiscas que pulavam....
Ele voltou e tentou dar a partida....nada de novo....ele desceu e começou a bater mais e mais tentando concertar alguma coisa,mas ai eu percebi que realmente o taxi pifou! Coloquei a mochila nas costas e desci do carro no meio da avenida. Peguei o dinheiro e tentei pagar para ele a metado do combinado, mas ele nao aceitou e com insistencia me empurrou de volta para dentro do carro repetindo: Please Madame, please...my cab, good cab, 1 minute please Madame...
Foi quando em um ato de desespero ele começou a falar com o motorista de um taxi que estava logo atras de nos, levando um passageiro tambem e meio que implorando fez com que o outro taxista descesse do carro dele no meio do transito para ajuda-lo a empurrar o taxi. Os dois empurraram, ele sentou, deu a partida e.................o carro pegou novamente!
Na mesma hora que ele ouviu o barulho do motor funcionando, ele olhou pelo retrovisor, abriu um sorriso e falou: See Madame...my cab, good cab! Good cab Madame! The best, the best in India!
A felicidade dele era tanta que ate beijou a direçao enquanto secava o suor do rosto com um pano. Ao chegar na casa do meu amigo, paguei o combinado e um extra...disse que era para ele concertar o melhor taxi de Mumbai!

Na manha seguinte fui com uns amigos tomar um belo cafe da manha...Era um restaurante, mais arrumado e foi quando eu me dei conta de que era a primeira vez, em quase 6 meses que estava tomando um verdadeiro cafe da manha, com paes, queijos,frutas, doces...nossa...foi muito bom! Achei o pao tao gostoso que ate comprei um para levar para Vadodara, pois la e dificil encontrar um bom pao que nao seja o pao de forma.

Apos o cafe da manha fomos caminhar pela orla de Mumbai que poderia ser maravilhosa, mas ao contrario, e suja, e totalmente largada...estava observando as pessoas que moram nos slums e vao para la, nessa parte em especifico que e mais rochosa, para lavar a roupa, tomar banho, dar banho nas crianças e usar como banhiero tambem. Comentei com meu amigo que e uma pena, pois se o lugar fosse limpo seria maravilhoso! Ele repsondeu dizendo: Keren, 60% da populaçao dessa cidade mora nos slums....60% da populaçao nao tem agua encanada! Nao tem banheiro! Voce acha que eles se importam... ?
Continuei observando aquelas mulheres lavando as roupas no meio das pedras, dando banho nos filhos e tentei entender a vida dessa gente....foi nesse momento que, de repente, tres crianças vieram correndo em minha direçao, cantando, rindo, pulando e me cercaram, como se estivessem brincando e em um piscar de olhos arrancaram a sacola da minha mao. Foi tudo tao rapido, nao tive tempo de reagir ou ate entender o que estava acontecendo. Eles sairam correndo, gargalhando e nem se deram ao trabalho de fugir...ficaram la, bem na minha frente tentando abrir minha sacola. Quando enfim o menininho conseguiu abrir minha sacola e viu que era um pao que estava la dentro, ele deu um berro de alegria e começou a pular tao euforicamente que eu nao pude conter o sorriso na minha cara. Acho que se ele tivesse encontrado ouro, nao estaria tao feliz! As 3 crianças gritavam de felicidade. Sentaram e dividiram o pao. Eu tive que gravar esse momento.(link para o video no final do post)
O susto passou e quando eles me viram ainda por la, vieram sorrindo em direçao a mim, agradecendo pelo pao (que eles roubaram!), mas foi um ato de completa travessura! Nem se deram ao trabalho de tentar pegar na minha bolsa ou mexer no meu bolso...

Fiquei me perguntando se eu estava errada em me sentir feliz por ver aquelas crianças com meu pao, fiquei me questionando se eu estava sendo muito “romantica” em aceitar a situaçao, afinal, nao deixou de ser um assalto! Mas olhando aquelas crianças, divindo e devorando o pao, sorrindo para mim, nao tive como ficar amarga. Pensei em SP, nas crianças de la que infelizmente se acabam nas drogas,muitas andam armadas com facas e canivetes, acabam se tornando criminosas....aqui isso e algo inimaginavel, mesmo com condiçoes precarias de vida tao parecidas. E acho que esse e o diferencial de Mumbai. As pessoas. E apesar de ser algo inaceitavel do nosso ponto de vista, essas pessoas aceitam, e a fe tem esse papel aqui. Por terem fe religiosa elas aceitam as condiçoes, acreditam que se estao passando por isso nessa vida e porque merecem. Por isso que elas se ajudam, so com solidariedade e que eles conseguem conviver nos slums, conseguem sobreviver.

Nao consegui tirar a imagem daquelas crianças da minha cabeça...fiquei o dia inteiro ouvindo aqueles gritinhos de felicidade.E e isso que faz eu ficar fascinada por Mumbai. As pessoas. E como meu amigo disse, Mumbai te faz sentir um amor, mas um amor ativo, pois apesar de voce observar e sentir a felicidade dessas pessoas voce entende que a realidade delas e cruel, que elas merecem mais do que isso, que elas nao precisam viver assim, e isso te provoca, te instiga, te faz querer mudar. Nao e um amor cego... mas e um sentimento que te traz uma inquietaçao profunda.

Link para o video:
http://www.youtube.com/watch?v=5-P1aTK-VTA

terça-feira, 22 de setembro de 2009

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

E o judaismo?

Antes de vir pra ca, eu ainda nao sabia direito onde iria morar, como seria minha cidade, minha casa, minha rotina, nada! Mas eu ja sabia que na cidade vizinha havia uma pequena comunidade judaica e uma sinagoga. Isso e que da ter uma idiche mame e um idiche papi internautas! Depois de uma intensa pesquisa e troca de emails, eles conseguiram o contato de uma indiana judia - Shulamit -disposta a me receber para um shabat quando eu quisesse.


Mas foi apenas depois de 4 meses morando aqui que tive a chance de ir para Ahmedabad conhecer essa curiosa e pequena comunidade judaica da India.

Shulamit me enviou por email um convite para a celebraçao dos 75 anos da sinagoga. A programaçao começaria na sexta-feira, com um shabat, e se estenderia ate sabado a noite. Muito simpatica, Shulamit se desculpou por nao poder me receber em sua casa desta vez, pois iria receber muitos familiares de Mumbai e Pune , mas fez questao de me reservar um quarto em um hotelzinho perto da sinagoga.

Ahmedabad fica apenas a 1 hora daqui. E uma cidade bem mais desorganizada, suja e pobre se comparada a Vadodara, mas nao deixa de ter um certo charme (charme nas proporções indianas). Segundo algumas informaçoes que me foram dadas e pesquisadas, a comunidade judaica se deu incio em Ahmedabad pois alguns judeus vieram com o serviço ingles, na epoca de domino sobre a India.Vieram com o exercito, outros com serviços como correiros, ferrovias, etc...seus filhos se tornaram advogados, medicos e professores. Mas hoje em dia, quase toda a comunidade fez Alia.

Para encontrar a sinagoga foi complicado. Situada em uma rua estreita, no final de um mercado de rua (que me lembrou muito as famosas Shuk's de Israel) a sinagoga e imponente. A primeira coisa que chama a atençao sao as grades pois, por aqui, nada (incluse os templos religiosos) tem proteçao como grades ou muros, mas a sinagoga, alem de ter um portao de ferro na entrada tambem tem 3 seguranças(2 homens e 1 mulher) com sensores de metal, revistando cada pessoa que entra. Outra coisa tambem engraçada e o toque do "charme" indiano que a sinagoga tinha...na parte de fora, muitas luzinhas coloridas, do tipo que vemos no natal, cobriam toda a fachada desde o telhado ate o piso. Na entrada, muitas flores e velas no chao. No salao interior a decoraçao nao podia ser diferente. Muitas flores penduradas, bixigas, tudo muito colorido! Colorido que ganhou ainda mais força quando a sinagoga começou a lotar, com as cores dos saris das indianas!


Assumo que inicialmente senti uma certa estranheza. Ver os indianos usando kipa, alguns conversando em hebraico, as mulheres tambem cobrindo a cabeça com um pequeno lenço...eu nao conseguia imaginar como, no meio de um pais enorme, no meio de tanta gente, no meio de uma reliigiao tao massiva que se faz presente com imagens e templos por todos os lados, ainda assim existe essa pequena comunidade judaica. Mas foi so começar o serviço de shabat que a estranheza foi embora! Foi confortante me sentar dentro da sinagoga, ler o sidur e ouvir as mesmas rezas de sempre, e mesmo estando tao longe e inserida em uma realidade totalmente diferente, mesmo assim, tive a sensaçao de estar em casa de um certo modo. E mesmo nao conhecendo ninguem, nao entendo a lingua deles, nao sabendo nada sobre a historia daquelas pessoas, na sinagoga falamos a mesma lingua, na sinagoga nos compreendemos, na sinagoga somos todos a mesma familia.

O shabat foi inteiro comandado por 3 meninos de 11 anos. Uma coisa linda! A facilidade e fluencia com que eles rezavam e liam o sidur, a concentraçao daquelas crianças e a atençao que todos os presentes davam foi algo unico! Todos rezando juntos, homens, mulheres, muito concentrados! fazendo todos os movimentos, de se curvar, de virar para um lado, para o outro...
Perguntei onde aquelas crianças aprendem hebraico e judaismo, pois escola judaica nao existe.Um dos presentes me contou que as aulas sao na sinagoga mesmo, todos os domingos pela manha, e as crianças nao faltam 1 domingo se quer!


Apos a cerimonia, fomos para o pateo externo onde o jantar foi servido. Para minha tristeza nao teve nada de vareniks, guefiltfish ou chala...era tudo comida indiana, obvio! Mas estava uma delicia mesmo assim.

Foi nesse momento que eu comecei a reparar mais no jeito desses indianos judeus, e ao mesmo tempo que percebi algo de muito diferente comparado ao jeito indiano de ser, percebi algo muito similar comparado ao jeito judaico de ser. Diferente dos outros indianos pois esses se mostraram mais tranquilos, falando mais baixo, um pouco mais "educados", e a similaridade ao jeito judaico foi percebida mais entre as mulheres. Todas tagarelando, cumprimentando todo mundo, as maes mostrando com aquele ar de orgulho os filhos para as amigas, com assuntos do tipo : - olha so como ele cresceu, eles esta estudando, vai viajar, bla bla bla... tambem reparei que as mais senhorinhas, antes de irem embora, fizeram o famoso "embrulhinho" com alguns dos docinhos para levar para casa...ok, nao sei se isso e de fato uma caracteristica judaica, mas na minha familia pelo menos posso garantir que e! :D



No dia seguinte, acordei cedo e fui acompanhar a reza da manha.
Depois foi a hora do tesoureiro da sinagoga agradecer algumas pessoas importantes da comunidade. Essa parte durou mais de 2 horas! Apesar da comunidade ser muito pequena (apenas 30 familias), eles fizeram questao de contar a historia de cada uma! de como cada membro tem ajudado a manter a sinagoga (ele leu um por um, todos os nomes de quem doou dinheiro e a quantia que cada um doou, todos foram aplaudidos!) e tambem homenagear todos os judeus que de alguma forma se destacam com importantes cargos em Ahmedabad. Muitos dos judeus fundaram escolas na cidade, alguns trabalham com o governo, um outro foi o fundador do zoologico da cidade, enfim....nao diferente de outros paises no mundo, temos representantes em respeitosas posiçoes profissionais.
Apos tudo isso, serviram o almoço, e eu fui embora.

Foi uma experiencia muito interessante. Eu estava totalmente desligada e distante do judaismo por aqui, eu estava apenas conhecendo e vistando templos e mais templos hindus, pesquisando e tentando entender as festividades hinduistas, e foi bom poder fazer um shabat, ouvir nossas rezas, me sentir acolhida de alguma forma.

Tambem fiquei bastante emocionada com os membros da comunidade de Ahmedabad, que com muita satisfaçao e alegria, se esforçam para manter a sinagoga funcionando, se esforçam para nao deixar a chama do judaismo se apagar no meio de tanta diferença e indiferença dos outros milhoes de habitantes da cidade. Se esforçam e se orgulham! Eles sao muito orgulhosos por serem judeus, sao muito orgulhosos por ainda carregarem nossa historia, e nao podia ser diferente! Eles sao vitoriosos e tem todo o direito de se orgulhar!


A festa da sinagoga foi um grande evento, judeus de Mumbai, Pune, e outros estados vieram participar e no dia seguinte ate uma materia saiu em todos os jornais, onde o hazan da sinagoga diz em um depoimento:
" This is the biggest day of our lives, this event is important for the entire community"

Achei tocante. Relatar essa comemoraçao como o maior dia de sua vida mostra a importancia e o valor que eles tem em manter nossa tradiçao e nossa religiao, e podem ter certeza, que se hoje estamos comemorando 5770 anos de historia e sobrevivencia, e por causa de judeus como eles. Que acreditam, que sentem amor e fazem questao de cultivar e permanecer com essa identidade, a identidade de um povo, de uma historia, de uma unica fe e de um unico D's!

Shana Tova!

Desejo a todos voces, nesse novo ano que se inicia, que possam carregar no coraçao um pouco disso tudo que eu pude relatar.Um pouco desse orgulho, dessa vontade e alegria de sermos judeus!


She hechianu vechimanu vehiguianu lazman aze!

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Trecho A Maça no Escuro

Foram longas horas de trem. Solitarias e silenciosas. Mas enfim, consegui terminar de ler um livro muito especial que foi meu companheiro de viagem. A Maça no Escuro de Clarice Lispector. Confesso que demorei relativamente bastante para terminar um livro de apenas 257 paginas, foi uma leitura paciente e desafiadora devido o texto de Clarice ser cheio de sugestao. Eu lia e relia por diversas vezes o mesmo trecho ate conseguir compreender a mensagem que existia alem do jogo de palavras.

Gostaria de compartilhar aqui um trecho que traduz da melhor maneira possivel (que eu nao seria capaz de fazer) tudo o que estou passando.

Ela quisera pela primeira vez fazer o que se chamava "viver" e , que num primeiro e incerto passo de gloria seria ir sozinha, ficar sozinha e se concentrar e ter o mais alto de si mesma.

Eu tinha ido para ficar sozinha e me concentrar, me separei de todos e fui de barca com minha mala - mas ja na barca estava ficando aquele ruim que eu reconhecia, aquela provaçao, aquela sensaçao quase boa mas perigosa - mal eu tinha pisado naquela barca que se balançava tonta e tudo ja me tocava e me deixava dolorosa, curiosa, viva, cheia de curiosidade - mas nao era isso mesmo o que eu queria? nao era isso mesmo o que eu tinha ido buscar? Era...mas por que e que eu nao queria me dar conta do que estava acontecendo? por que olhava para tudo de cabeça levantada, fingindo? Cheguei ainda de tarde, meu coraçao se apertou espantado, e as pessoas olharam eu passar entre elas. Eu nao conhecia ninguem e nao deixei ninguem adivinhar que isso me fazia o coraçao bater. Guardei a mala no quarto e meu impulso era o de tomar a barca e voltar, mas isso seria falhar! De algum modo eu tinha ido para sofrer o que estava me acontecendo, pois nao era a vida que eu tinha querido? e se eu nao soubesse aceita-la, somente porque ela era mais crua do que eu esperara - seria o fracasso.

O medo, o medo nao me deixava um movimento, mas depois que passou a surpresa - entao rebentou o que eu mal e mal tinha contido ate aquele instante - a beleza do lugar rebentou, a linha fina do horizonte rebentou, a solidao a que eu tinha voluntariamente chegado rebentou, o balanço da barca rebentou, e rebentou o medo da intensidade da alegria que sou capaz de atingir - e sem poder mais mentir, chorei rezando no escuro "nunca mais isso, oh Ds, nunca mais me deixe ser tao audaciosa, nunca mais me deixe ser tao feliz, tire para sempre a minha coragem de viver; que eu nunca va tao adiante em mim mesma, que eu nunca me permita, tao sem piedade, a graça, pois antes morrer sem ter jamais visto que ter visto uma so vez! porque Ds, com sua bondade permite e aconselha que as pessoas sejam covardes e se protejam, seus filhos prediletos sao os que ousam, mas ele e severo com quem ousa, e e benevolente com quem nao tem coragem de olhar de frente e ele abençoa os que abjetamente tomam cuidado de nao ir longe demais no arrebatamento e na procura da alegria, desiludido ele abençoa os que nao tem coragem. Ele sabe que ha pessoas que nao podem viver com a felicidade que ha dentro delas, e entao ele lhes da uma superficie de que viver, e lhes da uma tristeza, ele sabe que tem pessoas que precisam fingir, porque a beleza e arida. E entao eu disse para mim "tenha medo, porque ter medo e a salvaçao". Porque as coisas nao devem ser vistas de frente, ninguem e tao forte assim, so os que se danam e que tem essa força. Mas para nos a alegria tem que ser como uma estrela abafada no coraçao, a alegria tem que ser apenas um segredo, a natureza da gente e o nosso grande segredo, a alegria deve ser como uma irradiaçao que a pessoa jamais, jamais deve deixar escapar. Sente-se um estilhaço e nao se sabe onde: e assim que tem que ser a alegria: nao se deve saber porque, deve-se sentir assim: "mas o que e que eu tenho?" - e nao saber. Embora quando se toque em alguma coisa, essa coisa brilhe por causa do grande segredo que se abafou - eu tive medo, porque quem sou eu sem a contençao?



personagem Vitoria em A maça no Escuro

Clarice Lispector.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Fotos Varanasi









































Varanasi e arredores


Mal pude me estabilizar e me readaptar a loucura e bagunça de Vadodara apos minha semana tranquila em Sikkim que mais uma oportunidade de viajar me bateu a porta. Um amigo meu -indiano- me convidou para acompanha-lo ate Varanasi, pois seu pai faleceu e como ultimo desejo ele gostaria que suas cinzas fossem despejadas no Ganges. Nao tive como negar.Desde que soube que viria para India, conhecer Varanasi era uma das minhas prioridades. A cidade mais antiga e mais sagrada da India. A cidade da luz e da morte.

Como tinhamos poucos dias, meu amigo logo me avisou que seria uma viagem no indian "way of life", ou seja, 4 dias sem hotel, dormindo no trem e dando “um jeito” para tomar banho. Para falar a verdade, isso apenas me animou ainda mais!

Devido a Varanasi ser muito longe de Vadodara ele queria aproveitar para conhecer algumas cidades vizinhas. Durante esses 4 dias fomos para Varansi, Allahabad e por fim Khajuraho.
Quinta-feira a noite partimos de trem para Varanasi. Foram longas 27 horas de viagem. Compramos tickets na classe sleeper que sao vagoes compostos por 3 niveis de “camas” (tabuas) suspensas. Tudo muito apertado e compacto. Conseguir pegar no sono foi um pouco complicado pois os indianos nao falam,eles gritam! Eles nao riem, eles gargalham, e eles nao dormem, eles roncam! Roncam muito e muito alto. Perto disso, as baratinhas perambulando pelo chao e pelas paredes em volta de mim nao me incomodaram nem um pouco, mas depois que voce pega no sono a viagem e uma delicia, adoro o balanço do trem...

Na manha seguinte, acordei e para meu desencanto ainda estava no trem e ainda teria mais longas 20 horas. O engraçado e que voce acaba fazendo amizade com seus vizinhos de “quarto”, todo mundo acaba almoçando, jantando, jogando cartas juntos. O trem faz varias e curtas paradas, de 5 a 10 minutos no maximo! Fui me arriscar a descer em uma das paradas para comprar um suco e quase me dei muito mal, pois o vendendor nao estava entendendo o que eu queria e para comprar um suco, la se foram 4 e preciosos minutos,quando enfim ele entendeu, para conseguir o troco foi outro problema, la se foram mais alguns preciosos minutos, foi quando me dei conta que o trem começou a partir. Deixei o troco de lado e sai correndo para pular no vagao e por muito pouco quase fico para tras! Que susto! Depois dessa eu nunca mais me arrisco a descer do trem. Enfim, voltei ao vagao e tomei o suco de limao de caixinha mais caro da India. O tempo custou a passar, mas na manha seguinte (sabado) chegamos em Varanasi. Eram 4 e meia da manha, a cidade ainda estava escura,acordando. Pegamos um rickshaw ate um dos ghats do Ganges. Para entender um pouco melhor todo o misticismo e importancia que os hindus colocam em Varanasi, um pouco de historia:

Diz a lenda que Lord Shiva fundou Baranas (Varanasi),cerca de 5000 anos atrás que tambem e citada nos textos antigos como Kashi, a cidade da luz. Luz da consciência, luz da sabedoria, luz da compreensão espiritual. Luz que destrói as trevas da ignorância.Morrer às margens do rio Ganges é promessa de redenção, garantia de atingir a iluminação ou moksha, que é a libertação do ciclo eterno de nascimento, morte e reencarnação. Por isso que pelo menos uma vez na vida um hindu deve fazer a peregrinação até Varanasi e todos os dias eles chegam de toda India para se banhar nas águas sagradas. Tambem e interessante saber que em Varanasi existem muitos abrigos para idosos que nao tem familia ou estao doentes e optam por passar os ultimos dias de suas vidas se bahando e rezando no Ganges, esperando e se preparando para a morte, para a iluminaçao.Tudo acontece nos gaths, que são basicamente os degraus em direção ao rio.

Chegando em um desses ghats fizemos o tipico passeio de turista. Pegamos um barquinho a remo e navegamos o Ganges passando por todos os ghats enquanto o dia ia amanhecendo. Observar a vida na beira do ganges e algo incrivel. Pessoas meditando, orando, se banhando, lavando as roupas, praticando Yoga, e o som do remo ao fundo,calmo batendo na agua, os mantras cantados, os sinos ... eu nao conseguia enxergar aquilo tudo como real, para mim a sensação era de estar dentro de um livro muito antigo, uma viagem no tempo, foi dificil encarar tudo aquilo como algo que eu de fato estava vivendo. A energia do ambiente e inegavel, a sensaçao do tempo e diferente, uma paz e uma calma envolve a todos que ali se encontram. Puro misterio, pura espiritualidade, todos que estao la estao em razao da fe e da crença, nada alem. E voce sente isso, voce respira, voce se envolve. Tudo ja estava sendo muito alem do que eu imaginaria e foi quando as coisas começaram a ficar mais e mais pesadas, mais dificeis de compreender. Como eu disse anteriormente, meu amigo foi para la com um objetivo, o de despejar as cinzas do pai e isso teria de ser feito em frente Manikarnikha Ghat, o principal burning ghat de Varanasi, onde os rituais de cremação acontecem 24 horas por dia, todos os dias.
Primeiro ele teria que mergulhar nas aguas do Ganges para se purificar (aguas que servem como banheiro, lugar para lavar as roupas, tomar banho, escovar os dentes e jogar as cinzas e os corpos que nao sao cremados). Depois disso um ritual de rezas e bençaos se seguiu, de dentro do barco mesmo. Fiquei emocionada e ao mesmo tempo em choque quando meu amigo abriu o pote e despejou “o pai” no rio. Nao consegui e nem quis tentar imaginar a sensaçao que ele estava passando. Conheço ele a muito pouco tempo, mas pelo pouco que ele me contou a relaçao com o pai nao era das melhores, eles mal se falavam, o pai nunca foi presente,mas mesmo assim ele sempre teve muito orgulho e certeza de que seu pai era um bom homem. Depois disso, completamente sensivel eu ainda pedi para o barqueiro parar no burning ghat pois eu queria descer e ver tudo de perto. Meu amigo ficou no barco, ele nao quis me acompanhar. La fui eu sozinha. Entre montes de cinzas e nuvens de fumaça dos corpos que ali estavam sendo cremados eu desci e caminhei. Um dos sujeitos que trabalhava la, queimando e preparando as fogueiras me acompanhou e me explicou como tudo acontece. Me levou ate pertinho da fogueira de onde puder ver com perfeiçao a ossada sendo queimada. Logo ao lado uma nova fogueira estava sendo preparada, foi quando vi um corpo chegando, enrolado em um lindo tecido rosa. Provavelmente era de uma mulher. Aquele ar pesado, aquele cenario antigo, escuro e sujo e o cheiro de fumaça com o calor do fogo fez eu me sentir no buraco do mundo, no lado obscuro da vida, mas mesmo assim a sensaçao nao era de pavor ou de medo, incrivelmente e inexplicavelmente ainda conseguia sentir uma certa leveza. La as pessoas nao choram, nao se desesperam. Tudo acontece muito naturalmente, sem lamentações pois para eles esse e um momento de alivio, o momento da alma ser finalmente libertada. A cremaçao dura em torno de 3 horas e durante todo o tempo os familiares ficam ali, observando o corpo ser cremado ate a chama se apagar por completo. Faz parte do ritual. Para eles, esse e um momento de ensinamento e de reflexao sobre os misterios da vida e da morte.

Fiquei sem saber o que pensar, sem saber o que sentir, sem saber o que estava de fato acontecendo. Paralisei. Simplesmente me senti perdida. Assim que voltei para o barco meu amigo me apontou outra cena chocante. Como se ja nao bastasse tudo que eu estava vendo e sentindo, ao lado do nosso barco um homem estava na beira do Ganges, agaixado com um bebe recem nascido em seus braços, enrolado em um lençol branco e apenas com o seu rostinho delicado descoberto. Ele amarrou com uma corda o corpo do bebe em uma pedra, subiu em um barco e a uns 100 metros da beira jogou a criança no rio. (crianças, mulheres gravidas, leprosos e homens sagrados nao podem ser cremados)

Essa cena foi algo indescritivel. So de relembrar ja fico desestabilizada. Tudo isso aconteceu muito intensamente pra mim. Nunca percebi a morte tao proxima e tao viva.
O filho jogando as cinzas do pai, o pai jogando o corpo do filho, o cheiro da morte, a falta das lagrimas, tudo muito passivel, a morte sendo aceita.

O que foi para o pai a morte de um filho que mal teve a chance de respirar nesse mundo? Um filho que ele nao teve a oportunidade e o prazer de conviver, mas mesmo assim um filho para o qual um laço afetivo foi criado. Um laço de uma ponta so, um laço de sentimentos vindos apenas do pai que durante 9 meses foi criando dentro de si, foi criando amor, esperança, alegria, e tudo isso lhe foi tirado sem ao menos a chance de gozar desses sentimentos. E o bebe, sera que ele teve conciencia alguma sobre a vida? O que foi para o bebe a vida? Podemos dizer que esse bebe viveu? Sera que ele sentiu o viver? O pai com certeza sentiu sua morte, sentiu a perda, mas sentiu a perda de seus proprios sentimentos, sentiu o seu proprio laço se desfazendo, laço que foi criado de sentimentos prematuros.

E o que foi para um filho a morte de seu pai? Um pai sempre ausente, um pai que enquanto vivo parecia estar morto em seus pensamentos, mas ironicamente, sua morte lhe fez mais presente, mais vivo dentro do filho. A morte, que nesse caso, foi o fator de reaproximaçao, de reflexao sobre a falta. Agora o filho sente o amor, o amor que vem depois, o amor fruto do arrependimento, do perdao, da compreensao, o amor que renasce para adoçar as lembranças que antes eram amargas.

Tudo isso me levou a pensar que o sofrer causado pela morte e um sentimento egoista, sofremos por nos mesmos, pois sabemos que nos ficamos, fomos deixados e teremos que aprender a conviver e aceitar a ausencia, aceitar a ferida e carregar a cicatriz, e isso doi, isso e dificil. E dificil entender o que esta alem de nosso controle, a vida, a vida e dificil de compreender e so vivemos porque nos iludimos. Ja a morte, a morte e dificil de aceitar, pois temos medo, todos temos medo do desconhecido. Mas ao meu ver, deviamos temer a vida e nao a morte pois a vida nao passa de uma ilusao de vida e e uma responsabilidade muito grande e muito dificil sabermos o que fazer com essa ilusao. Afinal,o que e a vida se nao um caminho para o fim dela mesma? E o que e a morte se nao um caminho para o recomeço de uma nova vida?

O viver e a nossa oportunidade de amar, de fazer o bem, de criar laços e deixar boas lembranças, o resto nada importa, o resto e materia perecivel, o resto sao sobras.

Findado nosso passeio de barco, foi hora de caminhar pelas ruelas da velha cidade de Varanasi. Entre lojas e mais lojas, ruas estreitas, quase que como um labirinto, os corpos iam passando, vivos e mortos. Mas depois de uma hora eu nao estava me sentindo bem, meus olhos estavam fechando, estava me sentindo fraca, sem força para nada, como se toda a minha energia tivesse sido sugada, foi algo muito estranho, como um sono repentino muito profundo. Parei em um albergue e paguei por um banho. Precisava de uma ducha gelada. Foi o melhor banho da minha vida. Senti todo aquele cheiro, aquela fuligem, aquele peso e aquela morte descendo pelo ralo. Me senti mais leve, me senti renovada! Entao pude aproveitar mais de Varanasi. Tambem fizemos um city tour, paramos para almoçar em um lugar qualquer e fim da tarde fomos para a estaçao de onibus.Ufa! foram exatamente 12 horas continuas e intensas em Varanasi. Nosso proximo destino seria Allahabad. Mais 2 horas de viagem em um onibus caindo aos pedaços, so para terem uma ideia, choveu durante a viagem mas nem para-brisa o busao tinha, nao sei como o motorista conseguiu enxergar o caminho. Enfim, as 6 da tarde chegamos e so tivemos tempo para um city tour, alguns templos e um passeio no rio. Tudo isso debaixo de uma chuvinha muito chata que deixou a cidade inteira em lama e principalmente meu pe(eu estava de chinelos). Paramos em um shopping center e me utilizei do banheiro para me limpar um pouco e me trocar, pois estava enxarcada e em um estado deploravel!

De la fomos novamente para a estaçao de trem. O nosso partia as onze da noite rumo a Khajuraho. Depois de mais uma noite de um quase sono profundo no trem, chegamos na estaçao as 5 da manha do domingo. A vila de Khajuraho ficava a 60 km de distancia. Demoramos cerca de 1 hora para encontrar e negociar algum taxi que nos levasse para la. Depois de muita barganha, um cha e uma conversa conseguimos um motorista para nos levar a um preço justo. A viagem levou cerca de 1 hora e meia, o caminho era lindo, entre campos e pequenos vilarejos. Khajuraho e uma pequena vila tambem, mas com uma boa infra estrutura para turistas, pois e la que se encontram os famosos templos do kamasutra. Sao cerca de 22 templos todos minuciosamente esculpidos com figuras humanas em posiçoes sexuais. E um ponto turistico, e apesar da cidade ser uma vila e facil de encontrar bons hoteis, restaurantes e muitas, muitas lojas. Depois de uma visita pelos templos fomos conhecer a vila e seus moradores. O engraçado foram as crianças que, ja sabendo que os turistas sao aconselhados a nao dar dinheiro como esmola, elas ja vem pedindo coisas que sao dificeis e mais caras de conseguir, como por exemplo shampoo, ou caneta, ou qualquer material escolar, e tudo isso em ingles!Elas seguiam agente o tempo todo pedindo e repetindo:
- Shampoo, shampoo, shampoo... Pen, pen, pen...

Bom, depois de perambular pela vila, conhecer um pouco mais as pessoas e como elas vivem, foi hora de novamente pagar por um banho em algum hotel. Tomei um bom banho e seguimos para a rodoviaria. Dessa vez pegamos um onibus ate a estacao de trem. A viagem foi um pouco mais longa, pois o onibus parava em cada vilarejo recolhendo as pessoas. E incrivel ,mas quando voce acha que ja nao cabe mais ninguem, la vem mais 5, 6 pessoas subindo no onibus!
Chegamos de volta na estacao as oito da noite e nosso trem so era a 1 da manha. Por sorte havia um casal de espanhois que tambem estavam esperando o trem, o deles era meia-noite. Resolvemos ir para a cidade tomar uma cerveja. A cidade era um nada e estava sem luz, alem disso estava quase tudo fechado! Depois de algum tempo achamos um lugar que vendia cervejas. O jeito foi comprar e sentar na calçada mesmo. Foi interessante conversar com os espanhois. Ja era a sexta vez que o cara vinha pra India. Ele esta a cinco meses, apenas viajando, a mulher chegou ha 3 meses. Começamos a conversar sobre a India e suas contradiçoes tao fortes e marcantes. Pude perceber que o choque e os efeitos que esse pais causou em mim eram os mesmos para eles. A sujeira, a bagunça, a pobreza, mas ao mesmo tempo a espiritualidade, a energia, a magia desse pais que torna a experiencia de vir pra ca inesquecivel! E, apesar deles conhecerem bastante e ja terem vindo para ca algumas vezes, eles tambem nao conseguem explicar o que significa a India. O que acontece aqui. Como entender a alegria e as manias e costumes desse povo. Como entender a vida que e tao intensa e ao mesmo tempo tao desordenada.
Como Maria (espanhola) disse: para analisar a India voce tem que primeiro colocar uma moldura envolta e nao comparar com nada.Como um quadro, apenas analisar e vivenciar o que esta dentro dessa moldura sendo algo unico e particular. Concordo e ainda acrescento: analisar como quem analisa uma pintura abstrata. Para alguns, nao diz nada, e uma ausencia de forma e significado, enquanto para outros, diz muito, e o puro instinto, o puro sentimento que te faz caminhar pelas linhas inconcretas, cada canto te trazendo uma nova sensaçao, cada cor te surpreendendo de algum jeito e a arte como um todo te intrigando, quase que como uma provocaçao. Um quadro que alguns pagariam muito para ter, outros jogariam no lixo. E tudo uma questao de ter a sensibilidade e o dom de apreciar uma boa obra de arte, ou , nesse caso, ter a sensibilidade e a capacidade de apreciar a diferença, o estranhamento e uma boa obra da vida.

Voltamos para a estaçao, e depois de algumas cervejinhas foi facil pegar no sono no trem. Cheguei em Vadodara terça-feira as 6 da manha, cansada e muito confusa. Ainda acho que nao consegui absorver tudo que me aconteceu. Foi tudo muito rapido e muito intenso.

Mais uma vez, a India me surpreendendo e tornando a incompreensao da vida cada vez mais profunda e incompreensivel.

Namaste!


Video Varanasi: http://www.youtube.com/watch?v=BRwjIl2_6Gs

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Ganesha B-day!

Essa semana foi o aniversario do Ganesha, um dos deuses mais populares do hinduismo. Durante 10 dias consecutivos as pessoas saem pelas ruas, desfilando, cantando e dançando para a estatua de Ganesha, que sao feitas dos materias e modelos mais diversos. Nao existe hora nem um lugar especifico para esses "desfiles", eles simplesmente acontecem pela cidade, causando uma certa desordem na ja desordenada Vadodara, mas enfim, e uma grande celebraçao.


Desde que vim parar aqui na India eu estou tentando entender um pouco mais sobre o hinduismo, que ao meu ver, e uma religiao muito complexa, principalmente pelo fato de existirem tantos deuses diferentes, cada um com sua historia, lenda e mitologia especifica. O simples fato da adoraçao de imagens (e convenhamos, as imagens e deuses hinduistas sao um tanto quanto bizarras) ja e dificil para mim, uma menina judia que acredita em uma força maior, na construçao de uma espiritualidade interna e pessoal e nao em adoraçoes e oferendas a personagens metade humanos, metade animal.


Mas,como eu disse, estou tentando entender, e uma coisa que entendi e que por de tras de cada um desses deuses existe toda uma simbologia de valores humanos. Vou exemplificar com o Ganesha, que, para falar a verdade, e o unico que eu sei melhor ate agora.

Ganesha e o famoso deus que tem a cabeça de elefante no corpo de um homem com no minimo 4 braços e seu meio de locomoçao e um rato. Super normal nao e mesmo?

Bom...como a cabeça de elefante foi parar la e uma longa historia, mas vou tentar resumi-la da forma mais simples possivel. Ganesha e filho de Shiva que era casado com Parvati, acontece que o pai (Shiva) era um maluco que inventou o Yoga e vivia isolado nas cavernas das montanhas do Himalaia, alem disso, dizem por ai que as relações sexuais de Shiva e Parvati (que aconteciam quando eles se encontravam) duravam milenios e sem Shiva ejacular pois ele tinha completo dominio sobre o corpo,ou seja, Shiva nunca quis engravidar Parvati ou ter um filho com ela. Mas e obvio que toda mulher quer ser mae algum dia, por isso Parvati resolveu ter seu proprio filho. Diz a lenda que Parvati retirou um pedaço de sua propria materia e gerou o filho - Ganesha(essa parte eu ainda nao entendi muito bem), mas enfim....certo dia Shiva cansou de praticar Yoga isolado nas montanhas e decidiu fazer uma visitinha inocente na casa da mulher. Quando chegou na porta, encontrou Ganesha, que bloqueou sua entrada pois nao conhecia Shiva e estava protegendo a mae. Shiva ficou bravo, e lutou com Ganesha ate decapita-lo. Quando Parvati viu o filho decapitado exigiu que Shiva devolvesse a vida de seu filho. Com remorso, Shiva ordenou que seu exercito fosse para o norte e trouxesse a primeira cabeça do primeiro ser vivo que encontrasse. Bom, pelo jeito eles cruzaram uns elefantes...Shiva entao colocou a cabeça de elefante e deu a vida de volta a Ganesha. Parvati, ainda muito magoada exigiu que Ganesha fosse reverenciado no começo de todos os rituais religiosos, e assim foi feito.Moral da historia: a mulher sempre consegue o que quer!

Brincadeiras a parte, e mais ou menos essa a lenda de Ganesha. Mas o interessante e analisarmos sua figura, sua representaçao e as diversas alegorias presentes.

Ganesha tem uma enorme cabeça de elefante, imensa para um corpo de menino indicando sua capacidade intelectual e a firme dedicação ao estudo das escrituras. Ganesha é o Sábio.As enormes orelhas e a cabeça de elefante representam os dois primeiros passos para a auto realização - “Sravanam”, escutar o ensinamento e “Mananam”, refletir sobre ele. A tromba representa “Viveka”, a capacidade de discriminação entre Nitya, o eterno e ilimitado, e Anitya, o não eterno. O elefante usa sua tromba para puxar uma árvore, carregar grandes troncos para o rio, e para outros trabalhos pesados e a mesma tromba é usada para colher pequenas folhas de grama, quebrar um coco, etc...A maior e a menor das tarefas estão ao alcance dessa tromba.

Ganesha tem uma das presas quebrada representando o intelecto de um sabio pois o intelecto do homem comum está sempre preso entre os pares de opostos (as presas), ja o Sábio não é mais afetado por esses pares de opostos (frio-calor, prazer-dor, alegria-tristeza,etc) tendo atingido um estado de equanimidade.

O ratinho que fica aos seus pés simboliza o Ego e seus desejos com sua voracidade e cobiça, ele pode passar despercebido ou irreconhecível em lugares que pensamos ser impossíveis de se alcançar. Fazendo isso dificilmente há a preocupação de saber se ele esta buscando a virtude ou o vício. O rato então representa nossa mente, andarilha, instável e nômade, seduzida para lugares indesejáveis ou corruptíveis, mas mostrar o rato sempre submisso a Ganesha implica que o intelecto foi domado pelo poder de discriminação, que o sabio tem seus desejos sob controle.

Eu ainda poderia escrever aqui sobre as outras varias simbologias de Ganesha, mesmo porque, pelo o que eu pesquisei, nada e muito bem definido, existem varias interpretaçoes, mas acho que o basico e isso.

Durante esses 10 dias de celebraçao, em alguns dias espececificos acontece a imersao de Ganesha. Segundo a tradiçao deve-se imergir Ganesha na agua, para sua "desmaterializaçao". O resultado disso e um monte de Ganeshas destruidos e jogados ao mar e nos rios.

Infelizmente o indiano nao tem consciencia alguma sobre o meio ambiente e a importancia de preserva-lo. Imaginem, centenas de estatuas, de isopor, papelao, gesso, pintadas com diversas cores de tintas e sprays, tudo isso simplesmente despejado nos rios. Tudo bem, os rios ja nao sao nada limpos de qualquer maneira, mas e muito estranho perceber a falta de raciocinio das pessoas. Fico triste e ate com medo de julgar, mas confesso que acho tudo isso muita ignorancia. Seria como apos um desfile de carnaval no Anhembi, as escolas de samba simplesmente despejassem tudo no rio Tiete.

Mas ai vem o impasse: ate que ponto os costumes religiosos e a cultura tao rica do hinduismo pode ou deve ser modificada de acordo com as preocupaçoes atuais, do homem moderno?Sera que existe algum jeito de "reciclar" a mentalidade das pessoas e harmonizar os costumes dessa cultura tao antiga com o avanço intelectual do homem de hoje?? E nao me refiro apenas ao fato de despejar as estatuas nos rios, mas tambem a questao das castas, dos casamentos forçados, etc...

E mesmo que isso seja possivel, acho que demoraria seculos para alguma mudança de fato acontecer por aqui. As vezes tenho a impressao de que o povo indiano simplesmente parou no tempo, foi esquecido, esta perdido e ninguem se importa, o governo nao se importa, as instituições nao se importam...tudo e uma verdadeira bagunça em proporçoes gigantescas o que pode ate ser um reflexo da religiao: centenas de deuses, cada tribo com seu deus especifico, costumes especificos, dialetos especificos, nao ha uma unificaçao, tudo e aceitavel.

O lixo e aceitavel, as condiçoes miseraveis sao aceitaveis, a falta de educaçao e aceitavel, a desordem, a miseria, a desigualdade, as injustiças....por que aceitar tudo isso?


Obs: Fiz um video de um desses desfiles que aconteceu pertinho de casa. Segue o link para quem tiver interesse: http://www.youtube.com/watch?v=KOW_0HDILjk


Namaste!